quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O QUE É HAI ?

Corpo da mensagem

Hiperplasia Adrenal Idiopática (HAI)



Hiperaldosteronismo Primário

"Em 1956, Conn tornou-se o primeiro médico a caracterizar adequadamente o hiperaldosteronismo primário (HP).

A “síndrome de Conn”, contudo, refere-se principalmente ao hiperaldosteronismo secundário a um aldosteronoma adrenal".



Atualmente, acredita-se que o HP seja responsável por cerca de 5-15% dos casos de hipertensão arterial sistêmica (HAS) secundária. Apesar de desafiador, o diagnóstico de HP é crítico, uma vez que nestes casos a hipertensão arterial pode ser curada cirurgicamente”.



Fisiopatologia



Anteriormente, acreditava-se o adenoma produtor de aldosterona (APA) era a forma mais comum de HP.

Hoje, sabe-se que a Hiperplasia Adrenal Idiopática (HAI) bilateral responde por 45% dos casos de HP. O APA e a HAI são as duas principais causas de HP e sua diferenciação é vital, uma vez que cada uma possui sua própria abordagem terapêutica de escolha (a saber: cirurgia nos pacientes com APA e tratamento clínico na HAI).


Tabela 01 - Causas de HP

Adenomas produtores de aldosterona (APA)
• Hiperplasia adrenal idiopática bilateral (HAI)
• Adenomas produtores de aldosterona sensível à renina (APASR)
• Hiperplasia adrenal primária (HAP)
• HP familial (HPF):
- HPF Tipo 1 (HPF-1) ou Aldosteronismo glicocorticóide-remediável (AGR)
- HPF Tipo 2 (HPF-2 ou HPF não-sensível aos glicocorticóides)


A principal anormalidade fisiológica relacionada à HP é a produção autônoma de aldosterona. Dependendo do subtipo de HP, o controle da produção de aldosterona pode estar alterado de várias formas. Em geral, o APA e a HAP respondem ao ACTH, enquanto que a HAI e a APASR não respondem ao sistema renina-angiotensina (SRA).

No AGR (HPF-1), o SRA encontra-se inibido e a aldosterona é regulada pelo ACTH através de combinações quiméricas com regiões do gene aldosterona-sintetase (o que não acontece em situações normais). Dessa forma, os níveis de ACTH superestimulam a síntese de aldosterona. Nos pacientes com AGR, a administração de dexametasona (ou qualquer outro glicocorticóide) em doses capazes de suprimir a produção de ACTH resulta em redução da síntese de aldosterona, da natriurese e correção das anormalidades bioquímicas da HP.

Parece haver uma maior prevalência de HAI entre homens (proporção 4:1), negros e após a sexta década de vida. APA são mais comuns em mulheres (proporção de 2:1), entre 30-50 anos de idade.

Quadro Clínico



Deve-se suspeitar de HP em:

- Pacientes com hipocalemia espontânea ou não-provocada, especialmente entre hipertensos.
- Pacientes que desenvolvem hipocalemia severa e/ou persistente na presença de doses baixas ou moderadas de diuréticos não-poupadores de potássio.


- Pacientes com HAS refratária.



Além da hipertensão arterial, pode-se encontrar adinamia, distensão abdominal, íleo paralítico (decorrente de hipocalemia) e manifestações relacionadas às complicações da hipertensão (p.ex.: insuficiência cardíaca, seqüelas de AVC, sopros carotídeos, proteinúria, insuficiência renal, encefalopatia hipertensiva e retinopatia). Entretanto, pacientes com HP não costumam apresentar manifestações específicas ao exame físico, daí a importância de se manter um alto índice de suspeição.

Tabela 02 - Diagnósticos Diferenciais do HP

Adenoma Adrenal
• Carcinoma Adrenal
• Síndrome de Bartter
• Deficiência de C-11 Hidroxilase
• Deficiência de C-17 Hidroxilase
• Síndrome de Gitelman
• Síndrome de Liddle
• Síndrome de Cushing
• Síndrome de Chretien
• Síndrome de Gordon
• Eclâmpsia e Pré-Eclâmpsia
• Encefalopatia Hipertensiva
• Hipertensão
• Hipocalemia
• Acidose Metabólica
• Estenose da artéria renal
• Hipertensão renovascular
• Resistência aos Glicocorticóides
• Antecedente de ingestão de mineralocorticóides exógenos



Diagnóstico



O diagnóstico envolve 3 etapas: triagem, confirmação e determinação do subtipo de HP. Os principais testes diagnósticos são descritos a seguir:



A. Presença de Alcalose Metabólica (bicarbonato sérico >31 mEq/L) e Hipocalemia (potássio <>
a.1. Dado inespecífico: até 40% dos pacientes com HP são normocalêmicos.
a.2. A Hipocalemia isoladamente possui sensibilidade de 75-80% para HP em pacientes com dietas normossódicas.



B. Razão da concentração plasmática de aldosterona (CPA) sobre a atividade da renina plasmática (ARP) :
b.1. Pode (e é) ser utilizada como teste de triagem.
b.2. Valores normais são inferiores a 270 (quando a concentração de aldosterona é expressa em pmol/L) ou menores que 10 (quando a concentração de aldosterona é expressa em ng/dL).
b.3. Quando a aldosterona é medida em ng/dL e a ARP em ng/mL/h, valores acima de 20-25 apresentam uma sensibilidade de 95% e especificidade de 75% para HP. Quando a aldosterona é medida em pmol/L, uma razão maior que 900 é considerada compatível com HP.
b.4. Uma grande limitação deste teste está na variabilidade inerente da secreção de aldosterona devido a um ritmo circadiano intrínseco e ao uso de medicamentos anti-hipertensivos (que muitas vezes não podem ser suspensos apenas para realização de um exame diagnóstico).
b.5. O uso de inibidores da ECA aumenta a especificidade do exame, mas reduz sua sensibilidade.



C. Teste de Supressão do Captopril


c.1. Consiste na administração de uma dose de 25-50 mg de captopril por via oral. Em indivíduos normais, os níveis de aldosterona caem abaixo de 15 ng/dL.
c.2. Sensibilidade de 90-100% mas especificidade de apenas 50-80%.



D. Dosagem da Concentração Plasmática de Aldosterona


d.1. Após 03 dias de dieta sem restrição de sódio e 1 hora de repouso, indivíduos sadios apresentam níveis de aldosterona abaixo de 15 ng/dL. A presença de níveis acima de 22 ng/dL virtualmente confirma o diagnóstico de HP.
d.2. Uma vez que a secreção de aldosterona é variável, o valor preditivo positivo e negativo de uma única dosagem aleatória de aldosterona é limitado.
d.3. Até 40% dos pacientes com HP apresentam níveis normais de aldosterona e não podem ser diferenciados daqueles com HAS essencial através deste teste.



E. Excreção Urinária da Aldosterona em 24 horas (Aldo-U)
e.1. Uma das ferramentas diagnósticas mais úteis.
e.2. Encontra-se acima de 14 mg/dL na HP.
e.3. Menos de 7% dos pacientes com HP apresentam valores abaixo de 14 mg/dL.



F. Teste de sobrecarga salina


f.1. Consiste na ingestão diária de 10-12g de cloreto de sódio por 5 dias antes do teste e então dosa-se a CPA. Em indivíduos saudáveis, a CPA encontra-se em níveis abaixo de 8,5 ng/dL.
f.2. Este teste raramente é utilizado nos dias de hoje.



G. Tomografia Computadorizada das Adrenais com contraste
g.1. Só detecta aldosteronomas com diâmetro superior a 1,5 cm.
g.2. Pode ser complicado com a detecção de incentalomas (encontrados em até 10% da população).
g.3. A alta resolução do exame pode se tornar um problema, uma vez que a hiperplasia adrenal costuma associar-se à formação de nódulos, provocando confusão com adenomas autônomos.



H. Análise Venosa Adrenal
h.1. Dependente de radiologistas intervencionistas
h.2. Acurácia maior que 95%
h.3. Avalia a razão das concentrações de aldosterona entre as veias adrenais esquerda e direita. Uma razão maior que 10:1 indica secreção autônoma unilateral de aldosterona
h.4. Estenose da artéria renal pode produzir resultados falso-positivos
h.5. Complicações potenciais: trombose venosa ilíaca e adrenal, hemorragia adrenal, insuficiência adrenal
h.6. Este é um exame ideal nos casos com suspeita de HP onde as análises bioquímicas e os exames de imagem foram inconclusivos



I. Ressonância Nuclear Magnética
i.1. Não é superior à TC com contraste
i.2. Paciente com TC e/ou RNM normais: pode-se realizar tratamento com antagonistas da aldosterona por 6-12 meses e então repetir os exames de imagem



J. Cintilografia com iodocolesterol NP-59
j.1. Diferencia a hiperplasia dos adenomas
j.2. Acurácia de 90%
j.3. Desvantagem: disponível apenas em alguns poucos centros de referência de medicina nuclear
j.4. Principal alternativa ao teste de amostragem venosa adrenal


K. Teste de supressão de Dexametasona
k.1. Relevante apenas nos casos de possível HPF
k.2. Padrão em pacientes com AGR (HPF-1): pequenas doses de dexametasona (1-2 mg/ dia) normalizam os níveis de aldosterona plasmática e urinária e corrigem a HAS
k.3. Desvantagem: pacientes com HPF-2 não apresentam resposta positiva no teste



L. Teste da metoclopramida
l.1. Promissor na diferenciação entre aldosteronomas e HAI
l.2. Após uma injeção endovenosa de 10 mg de metoclopramida, os níveis séricos de aldosterona aumentam significativamente em pacientes com aldosteronoma, mas permanecem inalterados ou diminuem em pacientes com HAI.



M. Teste terapêutico com Espironolactona
m.1. Administram-se 100 mg de espironolactona via oral de 6/6h por 5 semanas. O teste é considerado positivo quando se observa uma redução de pelo menos 20 mmHg na pressão arterial diastólica
m.2. Por ser muito demorado e de aplicação difícil, não é mais utilizado como teste diagnóstico para HP



N. Teste de estimulação com ACTH
n.1. Consiste na injeção endovenosa de 250 mcg de ACTH
n.2. Nos pacientes com adenomas, ocorre um aumento abrupto dos níveis de aldosterona
n.3. Este teste não é mais utilizado devido à sua baixa acurácia


O. Flebografia adrenal
o.1. Caiu em desuso devido ao risco de infarto adrenal


Tratamento



Conforme mencionado, o tratamento de escolha difere nas duas principais causas de HP. Na HAI, a abordagem é essencialmente clínica, enquanto que no APA a cirurgia é a escolha na maioria dos casos.



No tratamento clínico da HP, os antagonistas mineralocorticóides (p.ex.: espironolactona, 25 a 200 mg VO por dia) são as drogas de escolha, oferecendo controle pressórico razoável associado ao efeito de antagonismo da aldosterona, com boa redução do edema e da ascite. Não devem ser utilizados em gestantes, na presença de insuficiência renal aguda ou em pacientes apresentando hipercalemia. Deve-se estar atento para as interações medicamentosas (p.ex.: a associação com inibidores da ECA ou AINEs pode causar hipercalemia) e manifestações estrogênicas em homens (p.ex.: ginecomastia, impotência). A combinação de espironolactona e diuréticos tiazídicos oferece um melhor controle dos níveis pressóricos que a espironolactona isoladamente.



Outros diuréticos poupadores de potássio (p.ex.: amilorida e triantereno) não são boas opções, pois não se ligam aos receptores mineralocorticóides. Por isso, são utilizados como medicações de segunda linha e precisam ser associados a outros anti-hipertensivos para produzir um controle adequado da pressão arterial. Bloqueadores de canais de cálcio (p.ex.: nifedipina) são úteis no controle da HAS, mas não corrigem o mecanismo fisiopatológico da doença.



No subgrupo de pacientes com AGR (HPF-1), deve-se utilizar a menor dose possível de glicocorticóides para manter o paciente normotenso. Deve-se preferir glicocorticóides de ação rápida, tais como prednisona e hidrocortisona (ao invés da dexametasona).



O tratamento clínico também pode ser indicado nos pacientes com doença unilateral (quando comorbidades não permitem o tratamento cirúrgico) ou nos casos bilaterais (para evitar a adrenalectomia bilateral). No pré-operatório, recomenda-se administrar espironolactona por 3 a 5 semanas - além de servir como uma ferramenta diagnóstica adicional, este tratamento é útil para reduzir os níveis pressóricos e as síndromes metabólicas associadas e para prever a resposta tensional pós-operatória.



A abordagem videolaparoscópica vem se tornando padrão. Cerca de 70% dos pacientes tratados cirurgicamente se encontram normotensos 1 ano após a cirurgia (53% permanecem sem HAS após 5 anos). A persistência da HAS após o tratamento cirúrgico é mais comum em pacientes com mais de 45 anos de idade, naqueles que eram hipertensos há mais de 5 anos e nos casos em que não se observou resposta pré-operatória durante o uso de espironolactona. Deve-se considerar ainda a possibilidade de ressecção incompleta do adenoma



Conclusão


Pacientes com HAS e hipocalemia e a maioria dos pacientes com HAS refratária ao tratamento devem ser examinados quanto à possibilidade de HP. A apresentação clínica da HP não é específica e o diagnóstico correto requer um alto índice de suspeita por parte do médico assistente.



A concentração plasmática de aldosterona (CPA) e a razão entre a CPA e a atividade da renina plasmática (ARP) são testes úteis para screening, mas não selam o diagnóstico. O diagnóstico deve ser determinado através da Aldo-U (medição da aldosterona urinária de 24h). A TC com contraste, apesar de útil, não detecta cerca de 50% dos adenomas e pode, em alguns casos, “lateralizar” incorretamente a doença. A Análise Venosa Adrenal é considerada o padrão ouro para determinar a lateralidade da doença. A Espironolactona é o fármaco de escolha nos casos com indicação de tratamento clínico.




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